Crise, cidade e criatividade [Contributo #2]
[contributo para reflexão, Rui Matoso]
Como ponto de partida, considero que o momentum actual é muito mais complexo do que uma simples crise financeira/económica, englobando em si uma crise política, uma crise ambiental, uma crise da globalização, enfim uma crise civilizacional.
As mais recentes descobertas da Wikileaks mostram de que forma é exercida a política internacional e a influência dos homens politica e economicamente mais poderosos do mundo, como se não tivesse sido ainda suficientemente claro aquilo que outros já afirmavam, Noam Chomsky por exemplo.
Ao nível nacional e local, a qualidade da democracia participativa está ainda aquém do que muitos estudos evidenciam ser possível e necessário, o consenso gerado artificialmente (sem debate de ideias) e aceite como coisa natural (naturalizado) demonstra até que ponto as nossas consciências estão colonizadas por um mecanismo de aceitação tácita do pensamento único, e das inevitabilidades...das austeridades.
A falta de conflito democrático e por conseguinte de visões políticas diferentes, promovem nas nossas cidades uma anestesia generalizada, impedindo o surgimento e a implementação de propostas mais criativas e catalisadoras de desenvolvimento económico e cidadania. O fenómeno do "cesarismo local" parece não ter desaparecido, talvez tenha apenas mudado de estilo, e até alastrado a sua influência a novas áreas como a da "cultura": desde as rotundas embelezadas por objectos à arte-pública domesticada, passando pelo estado da qualificação da dimensão cultural das cidades, tudo isto parece estar sob a batuta do gosto do autarca iluminado. (salvo excepções)
Está a tornar-se notório que os cortes ao financiamento das autarquias e a diminuição de receitas previstas surgem sem que haja uma busca de alternativas ao nível da gestão, ao nível da procura de soluções em parceria com a sociedade civil. Ou seja, a crise económica gera bloqueios ao desenvolvimento de alternativas, porque sem a preexistência de hábitos democráticos participativos enraizados, geradores de capital social e de confiança, o espaço público e a qualidade da vida pública/colectiva fica refém de mecanismos de controle mais arcaicos.
Nas dimensões política, cultural, social, económica e ecológica das cidades é urgente a mudança de paradigmas e de mentalidades, caso queiramos ver na crise o momentum para alterar o estado de coisas a que chegámos. Algumas sugestões...
Dimensão política / social: aprofundamento da democracia participativa através de iniciativas regulares: orçamento participativo, planos estratégicos de cidade, debates acerca de projectos futuros colectivos, capacitar as pessoas com menores capitais ou socialmente desfavorecidas...
Dimensão cultural: ver a cultura como um conjunto de capacidades individuais e colectivas a desenvolver e não como a dose de entretenimento merecida e apoiada pelo poder local. A cultura como cidadania simbólica e expressiva, a cultura como conhecimento, ciência e criatividade...
Dimensão económica: a economia criativa e do conhecimento podem ser implementadas em diversas cidades desde que haja um trabalho sério e articulado e não apenas o seguimento da ultima moda urbana. As artes representam vantagens competitivas para outras áreas de negócio, um hotel local pode oferecer pacotes de escapadinhas aos seus clientes em que a cultura seja um elemento diferenciador.
Dimensão ecológica: integrar o rural no urbano, aproximar as pessoas da natureza de modo a provocar uma consciencialização dos ecossistemas e da biodiversidade. Promover novos hábitos de consumo e alimentação saudáveis e menos poluentes...
Rui Matoso (rui.matoso@gmail.com)
http://www.culturaviva.com.pt/
Como ponto de partida, considero que o momentum actual é muito mais complexo do que uma simples crise financeira/económica, englobando em si uma crise política, uma crise ambiental, uma crise da globalização, enfim uma crise civilizacional.
As mais recentes descobertas da Wikileaks mostram de que forma é exercida a política internacional e a influência dos homens politica e economicamente mais poderosos do mundo, como se não tivesse sido ainda suficientemente claro aquilo que outros já afirmavam, Noam Chomsky por exemplo.
Ao nível nacional e local, a qualidade da democracia participativa está ainda aquém do que muitos estudos evidenciam ser possível e necessário, o consenso gerado artificialmente (sem debate de ideias) e aceite como coisa natural (naturalizado) demonstra até que ponto as nossas consciências estão colonizadas por um mecanismo de aceitação tácita do pensamento único, e das inevitabilidades...das austeridades.
A falta de conflito democrático e por conseguinte de visões políticas diferentes, promovem nas nossas cidades uma anestesia generalizada, impedindo o surgimento e a implementação de propostas mais criativas e catalisadoras de desenvolvimento económico e cidadania. O fenómeno do "cesarismo local" parece não ter desaparecido, talvez tenha apenas mudado de estilo, e até alastrado a sua influência a novas áreas como a da "cultura": desde as rotundas embelezadas por objectos à arte-pública domesticada, passando pelo estado da qualificação da dimensão cultural das cidades, tudo isto parece estar sob a batuta do gosto do autarca iluminado. (salvo excepções)
Está a tornar-se notório que os cortes ao financiamento das autarquias e a diminuição de receitas previstas surgem sem que haja uma busca de alternativas ao nível da gestão, ao nível da procura de soluções em parceria com a sociedade civil. Ou seja, a crise económica gera bloqueios ao desenvolvimento de alternativas, porque sem a preexistência de hábitos democráticos participativos enraizados, geradores de capital social e de confiança, o espaço público e a qualidade da vida pública/colectiva fica refém de mecanismos de controle mais arcaicos.
Nas dimensões política, cultural, social, económica e ecológica das cidades é urgente a mudança de paradigmas e de mentalidades, caso queiramos ver na crise o momentum para alterar o estado de coisas a que chegámos. Algumas sugestões...
Dimensão política / social: aprofundamento da democracia participativa através de iniciativas regulares: orçamento participativo, planos estratégicos de cidade, debates acerca de projectos futuros colectivos, capacitar as pessoas com menores capitais ou socialmente desfavorecidas...
Dimensão cultural: ver a cultura como um conjunto de capacidades individuais e colectivas a desenvolver e não como a dose de entretenimento merecida e apoiada pelo poder local. A cultura como cidadania simbólica e expressiva, a cultura como conhecimento, ciência e criatividade...
Dimensão económica: a economia criativa e do conhecimento podem ser implementadas em diversas cidades desde que haja um trabalho sério e articulado e não apenas o seguimento da ultima moda urbana. As artes representam vantagens competitivas para outras áreas de negócio, um hotel local pode oferecer pacotes de escapadinhas aos seus clientes em que a cultura seja um elemento diferenciador.
Dimensão ecológica: integrar o rural no urbano, aproximar as pessoas da natureza de modo a provocar uma consciencialização dos ecossistemas e da biodiversidade. Promover novos hábitos de consumo e alimentação saudáveis e menos poluentes...
Rui Matoso (rui.matoso@gmail.com)
http://www.culturaviva.com.pt/